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quinta-feira, 19 de julho de 2018

Com prazo mais curto que em 2010, PT tentará repetir missão de transferir votos de Lula a sucessor

Cientes de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - preso há três meses - tem pouquíssimas chances de se viabilizar judicialmente como candidato à Presidência, o PT se prepara para um desafio inédito. A tarefa da sigla até meados de setembro será amealhar cada vez mais votos para Lula para tentar transferi-los em bloco ao substituto do petista, a apenas três semanas da eleição, e levá-lo ao segundo turno.
Embora oficialmente Lula continue a ser o plano A da legenda - dentro do PT, nos últimos meses os dirigentes do partido tem repetido o bordão de que "Lula é igual bolo: quanto mais bate, mais ele cresce" -, a manobra de transferência de votos é considerada tão inevitável que o PT já
encomendou ao menos três pesquisas ao Instituto Vox Populi para tratar do potencial de transferência de voto do ex-presidente - que aparece nas sondagens eleitorais em um patamar de 30% das preferências dos eleitores.
"Verificamos uma capacidade de transferência do ex-presidente de no mínimo 20% dos votos e um teto por volta de 32%, no primeiro turno. Com isso, o candidato do PT iria para o segundo turno, talvez até mesmo na liderança", avalia Marcos Coimbra, presidente do Vox Populi.
Os resultados obtidos pelo instituto coincidem com os registrados por órgãos como Ibope e Datafolha: dois terços dos que se declaram eleitores de Lula dizem que votariam com certeza em um candidato indicado por ele.
Em um cenário sem Lula, os atuais líderes das pesquisas, Jair Bolsonaro, Marina Silva e Ciro Gomes, não superam os 20% das intenções de votos. O ex-governador da Bahia Jaques Wagner e o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, os possíveis sucessores de Lula na disputa, atingem de 1% a 2% das intenções de voto, no máximo, quando pontuam.
Dentro do próprio PT a estratégia é vista como arriscada. As condições de Lula hoje, na cadeia, o perfil do eleitorado do petista e o pouco tempo para informá-lo da troca de titularidade são obstáculos para o sucesso da empreitada.

O precedente de 2010

Os petistas que apostam em uma transferência de votos integral de Lula para seu substituto citam a eleição de 2010 como um precedente que confirmaria a tese.
Naquele momento, Lula quase elegeu sua sucessora, Dilma Rousseff, ainda no primeiro turno. As intenções de voto de Dilma foram subindo mês a mês em 2010, conforme ficava claro para o grande público que ela era o nome escolhido pelo ex-presidente. Seu opositor, José Serra (PSDB), registrava movimento oposto nas pesquisas.
Gráfico de transferência de votos a partir de pesquisas Datafolha de 2010
© BBC Gráfico de transferência de votos a partir de pesquisas Datafolha de 2010

No entanto, os percentuais de intenções de voto em Dilma e de eleitores que diziam desejar votar no candidato de Lula só se encontraram em agosto de 2010, quando teve início a propaganda eleitoral gratuita na televisão.
Àquela altura, já fazia ao menos dois anos que Lula viajava com Dilma a tiracolo, chamando-a de "mãe do PAC", o megaprograma de infraestrutura da gestão petista. Havia mais de um ano que não pairava dúvida sobre o fato de que ela seria a candidata do PT no pleito e fazia mais de um mês que a então ministra estava oficialmente registrada como a presidenciável petista. Isso sugere que o eleitor pode levar algum tempo para depositar o voto no candidato que realmente deseja.
"O Brasil crescia 7,5% ao ano, o Lula era chamado de 'o cara' pelo Barack Obama e ainda assim, demorou pra ficar claro para uma parte do eleitorado que Dilma era a 'mulher do Lula', como os eleitores chamavam na época", afirma Carlos Melo, cientista político do Ínsper.

Lula deixou vídeo para o sucessor?

Naquele momento, Lula era ainda o presidente mais popular da história, com mais de 80% de aprovação, detinha o controle da máquina da União e podia fazer campanha abertamente na TV e em viagens pelo país. O marqueteiro da equipe, João Santana, obtinha imagens com qualidade cinematográfica de Lula e Dilma para levar à TV.
Agora, preso, Lula está proibido de gravar vídeos ou subir em palanques. Há intensa controvérsia entre dirigentes do PT sobre se o ex-presidente deixou material filmado indicando sucessores antes de ir para a cadeia.
O ex-governador da Bahia Jaques Wagner e o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad: Jaques Wagner e Fernando Haddad são cotados para substituir Lula, caso a candidatura do ex-presidente seja mesmo impugnada
© Instituto Lula Jaques Wagner e Fernando Haddad são cotados para substituir Lula, caso a candidatura do ex-presidente seja mesmo impugnada

Nos últimos dias, as páginas sociais de Lula têm divulgado conteúdo audiovisual inédito do petista, em que o político se diz vítima de perseguição e explica sua conexão com o povo mais pobre. Em nenhum deles, no entanto, há pistas sobre sucessão. O PT não confirma oficialmente se tais vídeos existem. À BBC News Brasil, Haddad negou que existam cenas gravadas em que ambos aparecem lado a lado dizendo "Eu sou Lula", ao que o ex-presidente responderia "Eu sou Haddad".
Sem um material desses, ficaria difícil viabilizar a estratégia. "Por cartinha ninguém transfere voto, tem que ter a cara do Lula falando 'eu escolho fulano', para o leitor entender e confiar. E tem que ser todo dia na TV, dizendo isso e repetindo o discurso da perseguição", afirma o cientista político Bruno Wanderley Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais.

Dá tempo de transferir?

Ao contrário da estratégia adotada em 2010, dessa vez, o PT jogará contra o tempo. Se há oito anos Lula se esforçou para indicar sua sucessora meses antes do início da campanha, para torná-la conhecida e facilitar a transferência de votos, agora o PT levará Lula na cabeça de chapa até o limite do prazo da impugnação da candidatura no Tribunal Superior Eleitoral, em meados de setembro.
Lula e Dilma: Lula levou meses para transferir votos para Dilma Rousseff em 2010
© Instituto Lula Lula levou meses para transferir votos para Dilma Rousseff em 2010

A insistência está no cerne da estratégia política atual do PT. A legenda afirma que Lula foi injustamente condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro na operação Lava Jato, e que o ex-presidente é alvo de uma perseguição política para impedi-lo de voltar ao Planalto. Aceitar chamar alguém do banco de reservas a essa altura seria o equivalente a chancelar o processo contra Lula.
"Como nós do PT podemos abrir mão do Lula? Não temos condição política, eleitoral, moral, programática. O PT não pode e não vai abrir mão de Luiz Inácio Lula da Silva", questionou Haddad durante um debate com coordenadores dos programas de governo do PCdoB, PDT, PT e PSOL, organizado pelo movimento Quero Prévias.
Com isso, o eleitor poderá ter pouco mais do que 20 dias para ser informado de que Lula não será mais candidato, que o PT oferece um substituto. Pior, seja o escolhido Haddad ou Wagner, será um nome amplamente desconhecido do eleitorado médio. "A estratégia que está posta é arriscada porque ela diminui o tempo de informação para que esses eleitores, que são eleitores distantes da política, possam digerir e absorver uma nova situação com uma indicação", disse à BBC News Brasil o cientista André Singer, estudioso do eleitorado lulista.
Marcos Coimbra discorda da avaliação. Segundo ele, o tempo de informação do eleitorado diminuiu com a difusão do WhatsApp e de redes sociais. "Apenas 3 dias depois daquela confusão de prende e solta do Lula no domingo (8 de julho, quando o desembargador Rogério Favretto ordenou a libertação de Lula, até ter a decisão cassada pelo presidente do TRF-4, Thompson Flores), 95% do eleitorado dele já sabia o que havia acontecido", exemplifica.
Para ele, o imbróglio jurídico em torno do ex-presidente pode estimular a busca ativa do eleitorado por informação. "Certamente as pessoas vão querer mais saber quem é o candidato do Lula agora do que em 2010. As pessoas hoje trabalham com um cenário em que há primeira opção, que é o Lula, e terceira opção, que é algum outro. Não tem ainda uma segunda opção. Quando tiver, elas devem migrar para essa".

O eleitorado de Lula versus o eleitorado do PT

O eleitorado de Lula é basicamente composto por dois blocos, cada um deles com modos específicos de se orientar na hora de votar. Uma parte é o eleitor petista, que tem identificação com as pautas e propostas da legenda. A depender da pesquisa analisada, entre 16% e 19% dos eleitores brasileiros indicam ter simpatia pelo PT. Nesse grupo, o realinhamento de apoio para qualquer outro candidato petista seria mais facilmente assimilado.
A segunda parte do eleitorado de Lula são os lulistas: brasileiros de baixa renda e baixa escolaridade, de pequenas e médias cidades e que, no geral, experimentaram alguma ascensão social durante a gestão Lula. "Para além do partido, o Lula tem um eleitorado mais pessoal, que não necessariamente se alinha a questões partidárias", explica Marcus Melo, professor da Universidade Federal de Pernambuco.
"Com Lula, o PT foi bem sucedido para chegar ao Planalto porque superou o seu patamar de militantes e simpatizantes e capturou um grupo que chamamos de 'swing voters', aquele eleitor que não tem lealdade com ninguém e se move por um sentimento de bem-estar que o faz recompensar um governante, por isso essa identificação é muito mais pessoal", completa.
É nessa metade do eleitorado de Lula em que há, por exemplo, a possibilidade de migração de votos do petista para Bolsonaro, que estaria no outro lado do espectro político. Para Marcos Coimbra, esse eleitor enxerga semelhanças nas personas do ex-sindicalista e do ex-capitão. "Bolsonaro não encarna o papel de alguém que passou fome ou viveu na pobreza, mas se identifica com um baixa classe média, o morador da zona leste paulistana ou da zona norte do Rio, um homem com limitações comuns a alguém que não veio da elite", diz o presidente do Vox.
Para tentar reduzir a imprevisibilidade desse segundo grupo de votantes, o PT tenta se colocar como mediador entre Lula e o eleitor. Como o ex-presidente está preso e incomunicável, cabe ao partido denunciar as supostas perseguições contra Lula e mantê-lo em evidência. Gleisi Hoffmann, presidente da legenda, e os demais dirigentes, falam continuamente em nome de Lula. Com isso, o partido busca colar a imagem de Lula à sua imagem institucional.
"Percebemos nas pesquisas que, ao longo dos últimos meses, a questão da perseguição do Lula aumentou a vinculação dele ao PT e reduziu muito a distância entre o que é o petismo e o que é o lulismo", argumenta Coimbra.
Ainda assim, a percepção de que Lula segue sendo muito maior do que o PT é majoritária entre estudiosos. "Em pesquisas não registradas que colocam o Haddad como o candidato do Lula, notamos que ele atinge um patamar de 12%. Coloca o cara no jogo, mas não em um patamar vencedor. Eu não acredito que seja possível pegar todo o capital político do Lula e transferi-lo para o Haddad", diz Carlos Melo.

A transferência da transferência

Vencedor das últimas quatro eleições presidenciais, o PT precisa ao menos chegar ao segundo turno em 2018, para evitar o que dirigentes da sigla chamam de "tragédia" e manter sua hegemonia do campo da esquerda.
"O PT é o que chamamos de um partido majoritário. Abrir mão desse protagonismo que tem seria abrir mão de sua própria história", explica Melo.
Ciro Gomes em entrevista à BBC News Brasil: PT é refratário a apoiar Ciro Gomes e prefere transferir votos para um nome do partido
© Diego Padgurschi/BBC PT é refratário a apoiar Ciro Gomes e prefere transferir votos para um nome do partido

Isso explica porque o partido é tão refratário a conversas com lideranças de centro-esquerda como Ciro Gomes, que poderiam tirar do PT a primazia sobre a agenda no campo.
Lideranças petistas divergem, no entanto, sobre o que fariam caso ficasse claro, uma semana antes da eleição, que o escolhido por Lula não irá ao segundo turno e que nenhum candidato da esquerda estará na disputa final.
Em um cenário com Bolsonaro e Marina no segundo turno, por exemplo, Haddad tem afirmado reservadamente que abriria mão da candidatura em favor do candidato esquerdista mais bem colocado nas pesquisas. Jaques Wagner já afirmou publicamente que o PT deveria abraçar "um dos candidatos que estão aí", sem necessariamente indicar um nome próprio caso Lula seja mesmo impugnado.
Nesse caso, haveria uma tentativa de transferência da transferência. Para Marcos Coimbra, essa seria uma manobra "estranha" e bastante difícil de justificar para o eleitorado alinhado a Lula. "Mas tem gestos em política que são meramente políticos, e não orientados por pesquisa", diz.
Fonte: BBC NEWS

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