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Exclusivo: as alegrias, as dores e os desafios de Follmann na vida após a tragédia

É uma manhã quente em Chapecó. O Sol brilha forte e o calor é daqueles insuportáveis. O dia, em compensação, é lindo. Céu azul e a tranquilidade da bela cidade do Oeste catarinense. A beleza parecia prever a felicidade que tomaria conta do município mais tarde, com a vitória da Chapecoense sobre o Vitória e a permanência garantida na Série A do Campeonato Brasileiro de 2018, coroando uma boa temporada de reconstrução.
A Arena Condá se preparava para o importante duelo que aconteceria mais tarde. Nos dias de jogos, os atletas normalmente ficam na concentração aguardando a partida, mas, nesta manhã, ao chegar na casa da Chape, vi um goleiro, mesmo sob o intenso calor, fazendo o duro e pesado treinamento para os jogadores da sua posição.

Não, não era Jandrei.
Jackson Follmann fazia todos os exercícios pedidos pelos treinadores. Era seu primeiro treinamento de goleiro desde a tragédia em 29 de novembro de 2016, que teve ele como um dos sobreviventes.
O sorriso de Follmann era daqueles contagiantes, de um lado ao outro da face. Ele parecia não se importar nem um pouco com o calor.
Após o fim do treinamento, ele sai de campo realizado.
Agora, ele já se importa com o calor. "Fala que nós vamos fazer a entrevista na sombra? Tá quente demais", diz.
Brincalhão, Follmann seca o suor do rosto e brinca com todos. Os treinadores, os seguranças, a equipe de comunicação da Chape e a reportagem da Goal Brasil. Ninguém escapa das piadas.
Simpático, ao contrário do que normalmente acontece, é ele quem puxa papo com o entrevistador. "Rapaz, você é de Minas, né? Já deu pra perceber pelo sotaque. Que saudades eu tenho de lá e de vocês (mineiros)", comenta, antes de conversar mais sobre outros assuntos e fazer novas piadas com os amigos.
Follmann é muito alegre, o tipo de pessoa que você gosta de ter por perto. Alto astral, adora uma brincadeira, uma resenha e sempre quer deixar o clima tranquilo e feliz.
Nesta quarta-feira (29) se completa um ano desde a triste tragédia que causou a morte de 71 pessoas, a maioria delas muito próximas de Follmann, e interrompeu o sonho dele, de seus companheiros e de várias pessoas espalhadas por todo o Brasil, que estavam encantadas com a Chape e sua fantástica história.
No meio da dor de perder vários amigos, ele, que salvou Alan Ruschel, perdeu sua perna, passou por cirurgias delicadas e precisou encerrar precocemente a sua carreira, mas ganhou uma segunda chance de viver. A ficha ainda não caiu, e vai demorar para cair, como ele admite, em entrevista exclusiva à Goal Brasil.
No entanto, convivendo com Follmann, se você não parar para pensar, nem parece que ele passou por tudo isso. Um exemplo para todos nós, o hoje embaixador da Chape seguiu em frente. O ex(?)-goleiro não se esquece e nunca vai se esquecer de tudo o que aconteceu e dos amigos que perdeu, mas é feliz e alegra e emociona quem tem a sorte de poder conviver com ele, ainda que por pouco tempo.
Na conversa com a reportagem, Follmann falou sobre sua vida no ano após a tragédia, a Chapecoense, o grande amigo Alan Ruschel, a dor da perda, o jogo que não aconteceu e seus planos para o futuro. Confira:
Como está sendo essa nova vida e esse ano que se passou da tragédia?
"A vida está sendo maravilhosa. Hoje eu sou um amputado com muito orgulho e faço inúmeras coisas. Jogo meu futebol, dirijo meu carro e pratico várias modalidades do esporte. Eu estou muito feliz e também pratico o dia a dia do clube e o dia a dia nos treinos, e isso me faz bem. É um momento de aprendizado, de aprender muitas coisas e eu estou indo em busca disso para logo ali na frente poder colocar em prática tudo o que eu aprendi junto com esses 12, 13 anos em que eu estive dentro do esporte nas quatro linhas."
Qual foi o seu momento mais feliz e especial neste ano?
"Foi o momento em que recebi e coloquei minha prótese, consegui ficar em pé e dei meus primeiros passos. Foi um momento único que não vai sair da minha cabeça, porque depois que eu perdi a minha perna, o meu grande sonho era poder voltar a ficar em pé e caminhar. Eu não lamentei muito o fato de ter perdido a minha perna e a minha carreira ter acabado."
"O que eu mais lamentei foi ter perdido os meus amigos, como não poderia ser diferente. Teria sido injusto eu ficar reclamando de outras coisas. Eu ganhei uma segunda chance e foi um milagre de Deus. E eu me lembro de olhar para o lado depois de colocar a minha prótese e ver os meus pais e a minha esposa felizes da vida. Essa imagem nunca vai sair da minha cabeça. É a imagem mais linda que já vi. É um momento que eu nunca vou esquecer."
O que mudou na sua vida e no seu modo de ser depois da tragédia?
"Eu vejo as coisas simples da vida e valorizo muito o dia de hoje. Não que antes eu não valorizasse, mas existem coisas que passam despercebidas pela gente e fazem uma falta muito grande. Eu percebi isso no momento em que estava na UTI dos hospitais. Hoje eu valorizo as coisas simples da vida como o simples fato de você poder ir ao banheiro, estar com a sua família e poder abraçar a sua família, a sua esposa e os seus amigos em pé. Isso me fez uma falta muito grande. Hoje eu valorizo muito tudo isso e vivo muito o dia de hoje."
Quem conhece e vive a Chapecoense de perto logo nota que se trata de um time diferente em todos os aspectos. O que a Chape tem de diferente em relação aos outros clubes?
"A Chape é um clube que valoriza muito não só o atleta, mas também a família, e isso é muito importante no futebol, onde você vive sempre longe da família e das pessoas próximas. A Chapecoense valoriza isso. A Chape valoriza você, valoriza sua esposa, seus filhos e seus pais. Isso é um diferencial do clube, que é um clube família. E Chapecó é uma cidade maravilhosa para criar seus filhos. Você pode levar seus filhos para a escola e para o supermercado caminhando tranquilamente. A segurança aqui é muito boa e a cidade é maravilhosa."
Quero que você fale um pouco do Alan Ruschel, seu amigão de longa data. Como é o relacionamento com ele e vocês dois estarem juntos agora após sobreviverem?
"Cara, nós temos uma amizade muito grande, de mais de dez anos. Nós jogamos juntos na base do Juventude. Ele é um irmão querido que o futebol me deu. Temos uma amizade verdadeira e muito bacana. O fato de termos sobrevivido juntos é um milagre de Deus. Nós nos ajudamos muito. O Neto e o Alan se tornaram grandes irmãos e a gente sabe que precisa do apoio um do outro."
"O Alan é uma pessoa sensacional, que está sempre com um sorriso no rosto. Não tem tempo ruim com ele. Ele é um grande irmão que a vida me deu. A gente queria que o milagre que aconteceu com nós acontecesse com todos. A gente não pode fugir disso. Mas são coisas que... fogem da gente. Mas o Alan é um grande amigo e irmão que eu amo muito."
Como foi ver o gol dele contra a Roma, o primeiro gol dele depois de tudo que aconteceu?
"Foi um momento ímpar. Poder estar presente no primeiro gol dele depois de tudo o que aconteceu foi um momento mágico e único que vai ficar marcado para o resto das nossas vidas. Foi muito emocionante poder acompanhar e viver esse momento junto com ele. Com certeza foi um dia histórico para todos nós. O Alan é um cara sensacional, que dispensa comentários."
Você chamou o Ruschel para sentar com você no avião, não foi?
"O Cadu (Gaúcho), que era nosso gerente de futebol, foi para o fundo do avião e pediu para os jogadores irem para a frente e deixarem o fundo do avião para a imprensa. Mas o Alan só quis pular um banco. Como te disse, nós somos amigos faz mais de dez anos, e eu chamo ele de 'Rato'. Aí eu chamei ele para sentar comigo, para a gente ficar conversando e escutar música juntos. Eu pedi umas três vezes, até que ele veio sentar no meu lado. Isso foi uns 15, 20 minutos antes de tudo acontecer."
"Mas foi Deus quem me usou para chamar o Alan. Como eu te falo, tudo passa por Deus. Eu não salvei a vida de ninguém, Deus me usou. É o destino. Deus já planejou tudo. Como eu te falei antes, a gente queria que o milagre fosse para todos, mas são coisas que passam das nossas mãos (pausa). Não somos nós que iremos fazer diferente. Claro que poderia ter sido evitado, mas naquele momento foi Deus quem me usou para salvar o Alan."
Em 2016, a Chape foi campeã estadual, fez uma campanha épica na Sul-americana e garantiu a permanência na Série A no ano seguinte. Neste ano, manteve o título catarinense, foi bem nos torneios continentais e seguirá na elite brasileira em 2018. Qual é o sentimento de ver a Chape viver uma boa temporada e manter o nível?
"Eu só não gosto de comparar, porque o passado não tem comparação, mas a crescente é muito boa, tanto do clube quanto dos atletas. O trabalho dos atletas e do pessoal que atua nos bastidores tem sido muito bem feito, e a Chapecoense manteve seus pés no chão. O clube nunca deu um passo maior que a perna e fugiu das suas condições financeiras. Esse é o diferencial do clube e que bom que o clube continuou crescendo e com os pés no chão. O clube e a cidade de Chapecó, que sofreu e ainda sofre muito com tudo o que aconteceu, merecem isso e ganham muito com isso."
Você já se pegou imaginando a partida que não aconteceu?
"Poucas vezes. Se eu te falar que nunca imaginei eu vou estar mentindo. Com certeza eu já imaginei a gente entrando em campo contra o Atlético Nacional, principalmente naquela partida na Colômbia. Eu já imaginei a gente fazendo um excelente jogo, como de costume. Nós éramos uma equipe muito forte fora de casa."
"Às vezes eu tenho esses pensamentos e essas imaginações, e é uma imaginação saudável e um pensamento bom. A saudade é eterna, vai ficar para sempre. Eu só peço a Deus que todos os nossos irmãos possam estar bem lá em cima e sempre olhando por nós."
Já caiu a ficha de você ter sobrevivido, ser um milagre e estar seguindo em frente?
"Cara... É difícil. Eu não fico me perguntando o motivo de eu ter sobrevivido... Eu só agradeço a Deus por ele ter me dado essa oportunidade e essa segunda chance de viver. Eu procuro aproveitar sempre o dia a dia e o dia de hoje, e sempre poder ajudar o próximo e acrescentar algo na vida das pessoas, porque eu acho que a gente (os sobreviventes da tragédia) ficou aqui para isso também."
"A gente vê isso no dia a dia. As pessoas dão palavras de conforto e falam que a gente, por um simples fato ou gesto, mudou a vida das pessoas, e o que você puder fazer de positivo na vida das pessoas nos deixam muito felizes. A ficha vai demorar para cair. Foi um milagre de Deus. Não dá para fugir disso, porque se você pegar as imagens e tudo o que aconteceu, vai dizer que ninguém iria estar vivo, então, eu procuro sempre agradecer."
Você já foi comentarista e fez outras coisas neste último ano. Quais são os seus próximos passos e o que você pretende fazer daqui em diante?
"Crescer junto com o clube e dentro do clube como profissional. Agora, fora das quatro linhas, mas envolvido nos jogos e no dia a dia do clube. Eu quero fazer curso de gestão e me tornar um gestor dentro do clube. Claro que com o seu devido tempo e lugar, mas é um momento de aprendizado e, como eu te falei, eu quero crescer muito junto com o clube."

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